III END - Encontro Nacional de Desastres da ABRHidro
 

Carta de Niterói – III Encontro Nacional de Desastres

Entre os dias 06 e 09 de março de 2023 reuniram-se nas dependências do Campus da Praia Vermelha da Universidade Federal Fluminense (UFF), sediada na cidade de Niterói no Estado do Rio de Janeiro, em torno de 200 pessoas para realizar o III Encontro Nacional de Desastres (END). O III END foi organizado pela Comissão Técnica de Desastres (CTD) da Associação Brasileira de Recursos Hídricos (ABRHidro).

Tendo como tema principal “EVENTOS EXTREMOS E SOCIEDADE SOB A PERSPECTIVA DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS”, o III END abordou a influência das mudanças climáticas sobre os eventos extremos e seus efeitos na sociedade. O evento contou com 195 inscritos, submissão de 140 trabalhos de alta qualidade apresentados no formato oral e pôster, duas mesas redondas e duas palestras realizadas por pesquisadores de elevada relevância no tema. Além disso, destaca-se a reunião aberta ao público, onde pesquisadores, membros da Proteção e Defesa Civil e representantes da sociedade civil organizada compuseram uma mesa, onde foram fomentadas discussões acerca dos desastres sobre os diferentes pontos de vista.
No primeiro dia do evento, foram realizadas saídas de campo para três diferentes locais afetados por desastres no Estado do Rio de Janeiro (Angra dos Reis, Petrópolis e Nova Friburgo). Em todas as cidades foram visitados os locais afetados por desastres e sistemas de monitoramento e alerta existentes, destacando-se as particularidades geológicas, geográficas, sociais e econômicas de cada lugar. No segundo dia do evento, também foi feito o lançamento do livro “Desastres e Água – Eventos Históricos no Brasil”, tendo como organizadores Franciele Zanandrea, Masato Kobiyama, Gean Paulo Michel, Ayan Santos Fleischmann e Walter Collischonn e a participação de diversos coautores de todas as Regiões do Brasil. O livro é uma iniciativa da CTD e foi publicado pela ABRHidro.
Ficou evidente, a partir das apresentações técnicas e científicas, que o número de desastres naturais e tecnológicos vem crescendo significativamente no Brasil, bem como seus prejuízos, tanto de origem socioeconômica como ambiental.

A partir das discussões realizadas durante as sessões técnicas, apresentações e mesas redondas do III END, destacaram-se as seguintes questões:

  • No Brasil, país de dimensões continentais, é grande a diversidade dos desastres registrados. Exemplos trabalhados no evento foram: secas, estiagens, movimentos de massa úmida, alagamentos, inundações, enxurradas, rompimentos de barragens, tempestades, vendavais e ressacas (erosão costeira). Ainda, pontua-se que além desta ampla diversidade, foram apresentadas especificidades nas ocorrências de desastres ainda pouco discutidos, como secas na Amazônia e inundações no Nordeste.
  • Concluiu-se que é necessário aumentar o enfoque em pequenas bacias hidrográficas, visto que grande parte dos desastres apresentados, preponderantemente inundações bruscas e movimentos de massa, ocorrem nas pequenas bacias, e essas muitas vezes não estão sendo monitoradas.
  • Também foram discutidas as dimensões e magnitudes dos desastres recentes ocorridos no país, com destaque aos eventos ocorridos no litoral Norte de São Paulo e Sul Fluminense. Tais eventos ocasionaram diversas perdas de vidas e apresentaram os maiores registros de precipitação na história do país, alertando para a emergência climática e para a mudança de paradigma necessária para a redução de risco de desastres (RRD).
  • Outro tema debatido, que ressalta a urgência de uma mudança de paradigma, é a ocorrência de desastres em cascata, i.e., quando um evento causa uma série de impactos subsequentes. Apesar de serem cada vez mais frequentes esses eventos ainda são pouco discutidos no âmbito nacional.
  • Para a compreensão e a previsão dos desastres ficou clara a importância da existência de dados básicos das bacias hidrográficas em resolução adequada, como informações de topografia, batimetria dos cursos d’água, tipos de solos, volumes e intensidades de precipitações, dados de vazões e sedimentos. Sem tais informações não seria possível a geração de novos conhecimentos associados ao tema do evento.
  • Dada a importância dos dados básicos de caracterização física e hidrológica, foi repetidamente destacada a importância do monitoramento hidrológico, que inclui desde a coleta e processamento dos dados até a divulgação para a sociedade. Nesta linha, ficou clara a importância de leis que exijam a realização de monitoramento hidrológico por parte dos grandes usuários da água, como usinas hidrelétricas (UHEs), e da necessidade de investimentos públicos para esta ação, materializados através do trabalho de órgãos públicos diversos, com destaque para o Serviço Geológico do Brasil (SGB/CPRM). Também foram ressaltados os desafios e particularidades dos sistemas de alerta de desastres, bem como a importância do aperfeiçoamento na transmissão de informações e envolvimento com as comunidades.
  • Em mais de uma oportunidade foi comentada no evento a importância da saúde e do saneamento no contexto dos desastres. Nesta edição ocorreram palestras e apresentações de profissionais do setor da saúde, com a participação da Fiocruz, e de psicólogos que trabalham no pós-desastre, incorporando essas questões na discussão.
  • A participação da sociedade a partir de diálogos com atores e representantes das comunidades em eventos, fóruns e audiências públicas, se mostrou uma ferramenta de grande importância no alinhamento das ações a serem tomadas antes, durante e pós desastre.
  • Foi amplamente comentada, durante o evento, a importância da aproximação e colaboração entre as instituições que atuam na área de desastres no Brasil. O que se traduziria em ações mais efetivas na compreensão e na redução de danos de desastres. A exemplo, foi discutida a incorporação do mapeamento de áreas de risco de desastres na elaboração de políticas públicas como o Plano Diretor Municipal, responsável pelo ordenamento territorial.
  • Como último ponto de destaque, ressaltou-se mais de uma vez durante o evento a importância da aproximação entre o conhecimento gerado na academia e as ações governamentais, ou seja, entre ciência e política. O lançamento do livro sobre os desastres históricos no Brasil se apresentou como uma ferramenta capaz de facilitar essa aproximação. Por sua distribuição gratuita e disponível para gestores públicos, o objetivo da publicação consistiu em trazer os aprendizados obtidos com eventos passados para a gestão de risco de desastres de eventos futuros. Outra forma de materialização dessa relação é justamente a realização de eventos como o próprio END, motivando a realização de futuras edições.

Ainda, faz-se importante mencionar a participação bastante relevante de jovens pesquisadores. O evento teve elevada porcentagem de participação de alunos de graduação e pós-graduação. Além disso, destaca-se que o evento contou com a participação de um aluno de ensino médio, o qual submeteu seu trabalho que foi avaliado, aprovado e apresentado durante a programação. Sem a participação dos jovens pesquisadores, o evento não teria a mesma dinâmica e relevância. Além disso, cabe uma menção especial ao indispensável trabalho da Proteção e Defesa Civil em casos de desastres e destacar a presença de representantes vindos de diversos estados do país no III END.
Além disso, é importante ressaltar que o III END conquistou o Selo Atmosfera, da Associação Brasileira de Mulheres nas Geociências (ABMGeo), que representa o compromisso da comissão organizadora em favorecer a equidade de gêneros e raças entre palestrantes, em suas lideranças e falas convidadas, e acessibilidade para pessoas com deficiência. O encontro também recebeu o certificado de Carbono Neutro, em que foi realizada a compensação dos gases do efeito estufa gerados pelo evento a partir do plantio de espécies nativas para recomposição de uma área de mangue no município de Niterói. Também, ressalta-se que durante o evento não foram utilizados itens descartáveis e a comida e bebida oferecida foi vegana, produzida por produtores locais através de agricultura orgânica, visando à mitigação das ações que potencializam a emergência climática e, consequentemente, os desastres.
Finalmente, destaca-se que os quatro dias de evento foram de intenso trabalho e de relevantes discussões, proporcionando debates enriquecedores, além da divulgação de novos trabalhos que representam avanços na gestão e mitigação dos desastres. Espera-se que as discussões forneçam subsídios que favoreçam a adaptabilidade da sociedade às mudanças climáticas e fortaleçam capacidades voltadas à RRD no Brasil. Esta carta, junto com os ANAIS do evento, permanece como registro dos principais aspectos debatidos no III END.

Comissão Organizadora do III END

Download da Carta

 

 
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